sábado, 6 de abril de 2013

Liberdade de Expressão e intolerância

Dando sequência à série Desconstruindo a superficialidade do discurso da intolerância e do ódio, quero discutir um pouco sobre o conceito de liberdade de expressão que tem sido usado indiscriminadamente para justificar posições conservadoras e preconceituosas, falas racistas, homofóbicas, discriminatórias e com grande potencial de violência e tensão nas relações sociais.

Para evitar qualquer mal entendido, quero reafirmar meu total compromisso com a liberdade de expressão. Acredito que esse deve ser uma garantia fundamental na sociedade de modo a permitir o amadurecimento da democracia e do livre pensamento. Dessa forma, refletir, discutir, dialogar e construir devem ser ideais perseguidos eternamente. Porém, o compromisso com a liberdade de expressão não pode ser confundido com a liberdade para perseguir, excluir ou agredir minorias.


O pacto social é algo complexo, fundamentado na consolidação de uma série de direitos coexistentes que formam um arcabouço de defesa dos cidadãos e da coletividade. Direitos fundamentais são constituídos para preservar a ordem social, a liberdade individual e os direitos das minorias e formam um conjunto normativo que orienta condutas, pune desvios e disciplina comportamentos. Portanto, para analisar adequadamente o cada vez mais inflamado debate sobre homofobia e liberdade de expressão, é preciso ter em mente que, tão importante quanto a liberdade de expressão, é a preservação da integridade física e moral dos indivíduos e a garantia de exercício de sua plenitude enquanto ser humano e cidadão.

A luta histórica pela consolidação da democracia e de um estado capaz de assegurar a defesa de seus cidadãos resultou no amadurecimento dos conceitos de liberdade de expressão e estimulou o fortalecimento das demandas por respeito aos direitos humanos. Quando, surgem conflitos entre esses direitos, é preciso buscar uma abordagem transversal, capaz de encontrar pontos de contato, identificar pontes de diálogo, convergências entre conceitos para evitar que a defesa de um direito implique em fragilização de outros. 

Dessa forma, o argumento de que a liberdade de expressão justifica todo e qualquer tipo de abuso ideológico ignora o fato de que, ao propagar discursos de ódio e intolerância, a incitação à violência tem um potencial destrutivo significativo que coloca em risco a vida de milhões de pessoas renegadas à condição de minoria.

Nos últimos anos, o avanço em relação aos direitos individuais foi acompanhado por uma perigosa e poderosa onda conservadora. Ao mesmo tempo em se tem mais liberdade para demonstrar publicamente a orientação sexual, casos de violência contra homossexuais ganham as manchetes e expõe a até então silenciosa estatística de violência relacionada a gênero. Ao mesmo tempo em que mulheres reafirmam suas posições de protagonismo social, econômico e político, outras tantas precisam marchar pelo direito de expressarem sua individualidade sem serem hostilizadas como putas, vagabundas que merecem ser violentadas. Ao mesmo tempo em que o debate sobre a questão das drogas ganha a participação de importantes intelectuais, acompanhamos desastradas ações do Estado no combate ao crime. Ao mesmo tempo em que o STF promove avanços em relação ao aborto, o tema é usado de maneira baixa em um debate rasteiro por políticos que se apropriaram da bandeira da defesa da família para reduzir a última eleição presidencial a uma discussão rasteira, empobrecida e deturpada.

Nesse contexto, de fortalecimento da corrente conservadora, mensagens discriminatórias ganham contornos perigosos e podem incitar um estado de tensão e ódio entre grupos de cidadãos. É preciso ter em mente o poder da disseminação do ódio. Ao pregar contra determinados grupos, os interlocutores devem estar cientes do seu poder de influência sobre seus ouvintes e, caso essa consciência não seja inata, é preciso criar instrumentos institucionais para garantir a responsabilização daqueles que pregam o ódio e a intolerância.


A sociedade não pode permitir que discursos conservadores ganhem força a ponto de ameaçarem a consolidação de direitos individuais e o estado democrático vigente. Se, por um lado, é preciso garantir a liberdade de expressão, é preciso lutar para que ela não se torne instrumento de violência e propagação do ódio e intolerância. Um grande exemplo de que é preciso mudar inclusive a intolerância justificada pelo discurso religioso é a questão negra que, por muitos anos foi institucionalizada e ratificada inclusive pela Igreja Católica que negava a existência de alma para justificar moralmente a escravidão. Não estou dizendo que o preconceito em relação à cor da pele tenha sido superado, porém, os avanços do debate criaram constrangimentos que tornam inimaginável alguma pregação religiosa contra negros. A transformação é possível e deve envolver todos os entes sociais, Estado, população, imprensa, academia, todos devem se valer nas ferramentas de mobilização para promover a consolidação dos direitos humanos.

Para saber mais, acesse o site do PLC 122 projeto de lei contra a homofobia.

Democracia, Homofobia e, claro, Feliciano

Antes de começar o post, queria deixar claro que, sinceramente, gostaria muito de usar este espaço para discutir idéias e temas que realmente representassem uma evolução significativa da nossa realidade. Queria poder falar sobre ações inovadoras, projetos progressistas e discussões avançadas em vez de discutir assuntos que já deveriam ter sido superados da pauta nacional há alguns anos. Porém, dado o atual estágio das discussões em relação aos direitos LGBT, o protagonismo midiático do pastor e deputado Marco Feliciano, a posição corajosa de Daniela Mercury e o domínio do assunto nas redes sociais, precisamos aproveitar essa oportunidade para reforçar nosso compromisso com o respeito aos direitos humanos, a diversidade, a pluralidade e a igualdade entre cidadãos em um estado democrático de direito baseado em compromissos universais de direitos individuais. Dessa forma, segue mais um post sobre o tema.

Desta vez, quero usar o espaço para rebater algumas vertentes que utilizam a democracia para legitimar discursos preconceituosos, posições que estimulam o ódio e políticas públicas excludentes que relegam uma parcela significativa de sua população a condições de inferioridade jurídica e social.



Bolsonaros e Felicianos foram, sim, democraticamente eleitos e atendem aos requisitos jurídicos para representarem a população no parlamento. Porém, a vontade, ainda que seja da maioria, não pode ser usada para justificar abusos e desrespeitos a direitos consagrados pela constituição nem para incitar o ódio e a intolerância contra grupos minoritários. A democracia prevê a soberania da maioria desde que respeitados e preservados os direitos das minorias. Caso não houvessem mecanismos de equilíbrio nessa equação, incorreríamos no risco de termos uma tirania legitimada pelas urnas como a Alemanha nazista se mostra o caso mais célebre. Nesse sentido, a noção de justiça e igualdade surgem como tentativas de controle normativo da defesa das minorias diante de possíveis ameaças representadas pela vontade popular.

Saiba mais no vídeo abaixo do Ton Martins no VideoDebate do Youtube.


Nesse sentido, a atividade legislativa, respaldada pela vontade das urnas é também regulada por respeito a regras e condutas norteadas pelo respeito à diversidade, à pluralidade e a tolerância. Se não bastassem esses argumentos, Marcos Feliciano, deputado que já havia recebido destaque por suas posições preconceituosas e distorcidas fundamentadas em uma interpretação equivocada da Bíblia, se tornou presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Segundo definição no site oficial da Comissão  "Suas atribuições constitucionais e regimentais são receber, avaliar e investigar denúncias de violações de direitos humanos; [...]; além de cuidar dos assuntos referentes às minorias étnicas e sociais, especialmente aos índios e às comunidades indígenas, a preservação e proteção das culturas populares e étnicas do País." Como, portanto, alguém com histórico de desrespeito a minorias pode estar a frente de uma comissão com essas prerrogativas?

Além das restrições naturais de um deputado, contra a manutenção de Marcos Feliciano à frente da Comissão, pesam as atribuições da própria Comissão. Dessa forma, sinto muito senhora Rachel Sherazada, âncora do Jornal do SBT que mais uma vez utiliza uma concessão pública para comentários lamentáveis, mas a democracia não pode justificar o absurdo da manutenção do Pastor e Deputado Marcos Feliciano à frente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. 

Se, por um lado, a escolha de Marco Feliciano para a presidência da Comissão representa mais um lamentável episódio da nossa incoerência política partidária, sua permanência no cargo impõe, além de um constrangimento crescente ao órgão legislativo, uma paralisia institucional da comissão que deveria utilizar suas sessões para debater políticas e idéias e não rebater críticas da sociedade civil. Desde que tomou posse, Feliciano imprimiu uma rotina desgastante e contraproducente ao órgão vítima constante de protestos presenciais e online dos inconformados com a aberração ideológica. Assim, tornou-se insustentável a insistência do deputado em não renunciar ao cargo e a atividade da Comissão permanece ameaçada enquanto persistirem a teimosia e ganância por exposição midiática do deputado. 



Se ainda somos obrigados a conviver com forças conservadoras que insistem em reafirmar seus privilégios ao impedir a extensão de direitos a outros grupos sociais no sentido da construção de uma sociedade mais justa  que, ao menos, esses grupos não consigam se infiltrar nas ferramentas institucionais de defesa dos direitos humanos. Que os aparatos legais de defesa da diversidade sejam protegidos contra o avanço da intolerância, do ódio e da discriminação. 


quinta-feira, 4 de abril de 2013

Baixo Centro 2013


Vai rolar no Centro de SP, de 5 a 14 de abril, Festival Baixo Centro 2013, uma excelente iniciativa de ocupação artística da cidade por meio da organização independente da sociedade civil. Vale a pena conferir!

Por meio de engajamento individual para a transformação coletiva, a idéia é resgatar a noção de espaço público, de cidade à serviço do cidadão e de apropriação das ruas pelos seus verdadeiros donos: nós, moradores. Com diversas atividades (este ano serão mais de 500) que vão de apresentações de dança a intervenções de artes visuais passando por música, poesia e muita diversão, a iniciativa busca ressignificar a relação com a cidade provocando pela revitalização da região do entorno do Minhocão por meio da ocupação cultural. A lógica é simples, por meio da marcação de território pela arte, busca-se dar vida a uma região degradada por uma aberração da arquitetura urbana que privilegia carros em detrimento aos cidadãos.  

A organização do festival é feita de maneira horizontal e voluntária, a gestão é feita por qualquer pessoa interessada a contribuir e disposta a trabalhar. O financiamento é feito via crowdfunding por meio de doações individuais a partir de R$10,00. Não há financiamento de corporações privadas nem subsídios de programas oficiais de incentivo cultural e a prestação de contas é feita de maneira transparente por meio de orçamento publicamente divulgado.  


Se interessou? Dá uma olhada no site BaixoCentro.org e conheça mais. 

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Para TODOS!


A Geração G é o novo pensamento oriundo do despertar de consciências contra uma sociedade  individualista.    

Mais,  muito mais do que filantropia, é ter uma visão orgânica das relações humanas e sociais e os impactos que cada atitude gera nesse organismo social. 

                                                    Uma palavra contida em generosidade? 

                                                                        Colaboração!


A própria internet hoje encarna essa palavra, na prática,  quando pensamos na distribuição gratuita de conteúdos. Os blogs, o Wikipedia, por exemplo....

Fora desse campo, faço questão de  trazer aqui uma, (agora sim) uma personificação da Geração G.

Dr. Devi Prasad Shetty... conhecem?  Ele é dono, idealizador, presidente do Hospital Narayana Hrudalayalaya.


Trata-se de um hospital, na Índia, que acredita que uma solução que pessoas que precisam não têm condições de pagar, não é uma solução. Nesse sentido, o hospital se estruturou de modo a fazer com quem precise encontre as soluções para seus problemas. 

Um cirurgia cardíaca, do mesmo porte da que é feita no hospital, custaria US$50.000 no Estado Unidos. Em Naryana, o custo é US$3.000.

O pensamento cerne do hospital gerou essa redução de custos.

Uma roupa utilizada pelos médicos nas cirurgias, que poderia ser importada, é confeccionada no próprio hospital. O material é comprado, mas a costura é feita lá. 
O maquinário de ponta é comprado direto da fábrica em grande quantidade... 

Cada pequena "barganha" dessa foi pensada, para, no fechamento da conta, ser acessível a todos!


Mesmo com o custo reduzido, muitos bolsos não são capazes de suportar tal valor. 
O passo além: Quem tem mais paga mais ... Quem tem menos, paga menos... e, quem não tem nada, não paga nada... porque a Missão dele é: Sonho de levar o cuidado de qualidade à saúde acessível às massas de todo o mundo"



Ainda assim, frizo: Ainda assim, o hospital apresenta margem de lucro maior do que a maioria dos hospitais americanos: 7,7% (depois de impostos) x 6,9.


Para quem ainda não é movido apenas pela busca da "generosidade", a última informação abre as portas para uma discussão contra os valores excessivamente rígidos e  de um sistema econômico extorsivo. A busca pela universalidade e generosidade não é repelida pelo conceito de lucro e pelo próprio senso de capitalismo.


Pessoalmente, acredito que seja um resultado natural na preocupação com a qualidade e na busca de uma atitude menos individualista.

Para todos!